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sábado, 8 de dezembro de 2012

Resenha: Drácula, de Bram Stoker


O mundo vampiresco se encontra em estado crítico, tanto que, com a saturação dos novos paradigmas impostos aos chupadores de sangue, está difícil não só escrever novos trabalhos a respeito do tema, como também ler um clássico como “Drácula” sem estar embutido destes valores distorcidos. Neste sentido, a obra de Bram Stroker pode acabar por descontentar um grande público por, (1) não trazer uma figura andrógina e galante, e (2) por usar de mitologias um tanto quanto “ultrapassadas” a respeito destes seres.

Contudo, despindo-se dos nossos valores pós modernos, podemos enxergar em “Drácula” um trabalho cuja qualidade literária é impar. Em primeiro lugar, por nos trazer um estilo de escrita ousado e interessante. Toda a narrativa nos é apresentada em forma documental. Não existe um narrador onipresente e onisciente, seja em primeira ou terceira pessoa. A história nos é contada através de cartas, diários, notícias de jornais, transformando o livro em um apanhado textual que, organizado cronologicamente, traz aquele gostinho de possibilidade, e veracidade, aos fãs de fantasia. E isso é possível porque estes documentos, além de constitutivos da narrativa, são também fontes utilizadas pelos próprios personagens que as manuseiam e comentam.

Um segundo ponto digno de nota é a própria construção do mistério. É claro que para nós, leitores do século XXI que, por mais que nunca tenhamos lido “Drácula” conhecemos bem sua história, o mistério por detrás dos estranhos acontecimentos que giram em torno dos personagens são facilmente previsíveis. Entretanto, isso não tira o mérito genial da construção do enredo, que passa do diário de Jonathan Harker para as cartas entre Mina Murray para Lucy Westenra, de forma a deixar o leitor com aquela pulga atrás da orelha, ansioso por querer saber o desfecho da parte anterior da história.

Neste sentido, a leitura de Drácula é altamente recomendada. Não por ser um clássico em si, mas pela sua própria qualidade estética. Por ser um trabalho que se constitui em uma pesquisa sobre o mito dos vampiros, e não apenas frutos da imaginação fértil e descomprometida de autores que resolvem escrever sobre o tema sem antes querer, minimamente, saber sobre o que falam.
 

Resenha: O Ciclo – Volume 1: Despertar, de Wanessa Maciel


É sempre interessante ver trabalhos que busquem explorar universos tão pouco convencionais a fim de nos entreter com boas histórias fantásticas. Fugindo dos elementos comuns, tais como mitologia grega, vampiros ou bruxos, “O Ciclo”, da jovem Wanessa Maciel, nos traz uma saga de fantasia contemporânea onde elementos da mitologia nórdica são incorporados à narrativa de forma bastante didática, o que possibilita aos leigos no assunto, como eu, a se inserirem nesta temática.

Voltado para os jovens leitores, o livro respeita bem seu público, não perdendo tempo com descrições exageradas ou diálogos mornos e pouco construtivos. A jovem Roberta, ao se descobrir como herdeira de uma deusa nórdica, vê seu mundo virar de pernas para o ar e sua rotina, que se situava entre a faculdade de letras e a casa com a família aparentemente perfeita, muda radicalmente, sendo inserida em uma trama de traições, segredos e troles que investem pesadamente em arrancar sua vida.

E o leitor não precisa esperar para que esses acontecimentos drásticos logo invadam a vida de Freia, deusa da qual Roberta é regente, tornando as páginas de “O Ciclo” ágeis e de fácil transição. É provável que, assim como eu, outros sintam que o final ocorreu de forma um tanto quanto brusca, sem necessariamente resolver dilemas fulcrais para o saudável encerramento do primeiro volume. Todavia, como este é o primeiro de outros, este não é um pecado mortal, mas que deve ser resolvido nos próximos volumes. Fica então, para Wanessa, a motivação e, também, o desafio.

domingo, 2 de dezembro de 2012

“Diário de um escritor” ou “Os dois lados da rotina na literatura”.


É claro para todos que quanto mais fazemos alguma coisa, mais apto nos tornamos a realizá-la. Mais nosso corpo e nossa mente se acostumam a tarefa e menos nos sentimos cansados ou estressados por conta disso. Sem dúvidas a prática leva a perfeição, todavia quando falamos do hábito de escrita, deve haver um cuidado para que esta “perfeição” não acabe por se tornar simplesmente rotina, e, assim, comprometer a qualidade da obra em questão.

Vocês já repararam como alguns autores best seller, em especial aqueles que possuem dezenas de obras publicadas, começam a se tornar repetitivos em seus trabalhos ao longo do tempo? Como se chega a um ponto em que você, leitor, acostumado com o seu estilo, acaba por prever acontecimentos, falas ou locais antes mesmo de chegar às páginas equivalentes? Pois é, eu também percebo, de vez em quando, isso. E pior, comecei a sentir isso quando eu mesmo escrevia.

O Véu, meu primeiro livro, foi um verdadeiro parto. Necessitou de inúmeras revisões, pois eu nunca sabia como dar continuidade a uma parágrafo, ou que palavras seriam melhor empregadas para descrever alguma cena. Com isso, eu basicamente escrevia e reescrevia várias vezes a mesma passagem até chegar a um ponto em que considerasse o resultado minimamente satisfatório. No fim, saiu. Mas não sem sacrifícios.


De Corpo e Alma e segundo volume de O Véu - respectivamente meu segundo e terceiro trabalhos – foram sendo produzidos de forma mais natural. Aos poucos, eu ia me acostumando com a prática, já sabia os recursos estilísticos, as figuras de linguagem que melhor se encaixavam, e também já tinha maior experiência em construir cenas de amor, comédia, drama ou suspense.

O problema mesmo despontou quando escrevi O Salto. Meu último trabalho finalizado e registrado. Esses quatro livros acima citados foram escritos em um período de tempo muito curto, pois corresponderam ao meu início na faculdade onde, além de ter mais tempo livre, foi o período em que despertei para esta prática, onde tive pela primeira vez o gosto pela escrita e que, por conta disso, acabei por desenterrar todas as ideias que tinha guardadas desde os tempos em que jogava RPG na adolescência e as lancei em documentos de word.

E foi então que senti algo estranho ao concluir O Salto. Eu não sabia o que era, mas havia algo de estranho, algo que me incomodava e não sabia o que era. Eu simplesmente não sentia mais a animação em passar pelas páginas para revisar, tal qual sentia ao reler meus trabalhos anteriores. Foi então que a ficha caiu: eu havia rotinizado minha escrita. Algumas passagens eram basicamente iguais a outras que eu havia escrito antes, momentos de tensão, alegria e reflexão estavam semelhantes aos de O Véu ou De Corpo e Alma e eu estava me tornando repetitivo em minhas figuras de linguagem.

Enfim, foi o momento em que percebi que deveria parar e descansar um pouco. As ideias continuaram vindo, mas seguir aquele ritmo acabaria por me tornar aquilo que sempre detestei: um escritor fordista.

Chamo de fordistas aqueles escritores que, trabalhando em série, produzem várias obras cujas temáticas e os personagens podem ser diferentes, mas as estruturas se mantém as mesmas. Roteiros prontos, onde os momentos passam a ser completamente previsíveis. E a menos que você seja um leitor muito pouco exigente, chega a um ponto em que aqueles trabalhos não mais te agradam, pois não conseguem mais atender a uma expectativa básica de quem procura um bom livro: um gostinho de algo novo.

E neste sentido, chega-se a uma faceta prejudicial da experiência. Pois se por um lado ela lhe torna mais maduro naquilo que você faz, esta também pode ser responsável por lhe tornar inerte em seu ofício. Incapaz de fazer algo de diferente. Uma coisa que, quando falamos de arte, é essencial.

Hoje, estou com um novo projeto, Despertar, que demorei para iniciar simplesmente pelo fato de sentir medo de fazer apenas mais do mesmo. Conversei até mesmo com meu editor, contando de minhas dificuldades, e agora, quase dois anos depois de escrever meu último livro, me sinto apto a continuar. O Salto está, até o momento, engavetado. É um trabalho do qual gostei bastante, mas que tenho que retornar a ele para ver se consigo tornar aquela boa ideia em algo novo, original. Algo que me acenda a chama da euforia ao terminar. Tal como aconteceu nos dois volumes de O Véu, como se despontou em De Corpo e Alma, e como está sendo agora em Despertar...