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domingo, 27 de outubro de 2013

Resenha: O ladão de destinos, de Nanuka Andrade


Reunindo qualidade gráfica e literária, “O ladrão de destinos” se apresenta como um prato cheio para os fãs do gênero fantasia e para os amantes da literatura infanto juvenil. Além da originalidade do roteiro, sua história chama a atenção por incorporar elementos que muito lembram os antigos filmes da Disney, tanto no que diz respeito às ilustrações, quanto ao próprio enredamento da estória e constituição dos personagens. Detalhe esse que possui a capacidade de agradar tanto ao público jovem como adulto.

Ambientado na cidade de São Paulo, Mayumi Chen, jovem estudante de ascendência oriental, descobre-se portadora de uma habilidade especial: ela consegue vagar pelos dois planos que separam o que seria o mundo material do espiritual, ou o mundo dos despertos e dos adormecidos. Além desta capacidade única, por acidente, revela-se também para Mayumi um dom um tanto quanto perigoso. Ela tem o potencial para ser uma ladra de destinos.

Roubando por acidente o destino de seu irmão, que ainda se encontra na barriga de sua mãe, Mayumi tem que se colocar em uma aventura para reaver e devolver o brilho retirado do pequeno Chen. Conhecendo assim personagens misteriosos e fascinantes, atravessando planos fantásticos, e descobrindo segredos místicos, Mayumi, descobre em si não apenas uma ladra de destinos, mas também uma pessoa muito mais forte e destemida do que jamais se imaginou.

Nanuka traz para o cenário de “O ladrão de destinos” a influência da cultura oriental, elemento este bastante acrescentador para nossas livrarias atuais, saturadas da presença europeia e americana. E Mayumi é uma personagem fortemente impactada pela novidade do mundo em que se descobre e suas questões em muito apresentam nossas próprias indagações a respeito de questões primordiais: “quem nos somos?”, “para onde iremos?” e, acima de tudo, “o que fazemos aqui?”.

Nesse sentido, recomendo a leitura de “O ladrão de destinos”, pela sua originalidade, leveza e conteúdo, que nos enleva com uma história prazerosa, mas nos põe a questionar sobre assuntos que dizem respeito a todos. Afinal, qual seria o nosso destino neste mundo no qual vivemos, onde muitos possuem respostas, mas poucos se perguntam?

terça-feira, 30 de julho de 2013

Lendo nas entrelinhas do Papa: análise de discurso.


Sei que posso parecer chato ao levantar tal polêmica, mas realmente fiquei intrigado com o resultado do discurso do Papa Francisco acerca, entre outras coisas, da homofobia. Intrigado, pois realmente me espantou a maneira como tal posição foi aceita quando inúmeros pastores radicais são execrados quando expõem suas opiniões.

Todavia, tal aceitação parece mais compreensível quando temos na figura de Chico a imagem de um bom velhinho, caridoso, calmo e gentil, enquanto outras personalidades religiosas da grande mídia parecem fazer a questão de apresentar sua faceta mais severa e seu tom mais punitivo.

Mas vamos realmente prestar atenção no que o papa nos disse?

“Se uma pessoa é gay, procura Deus e tem boa vontade, quem sou eu, por caridade, para julgá-la?”

Gente, falando sério, só eu percebi que há algo de muito errado nisso? Vejamos bem, há aceitação neste discurso? Não. Há a posição de que a homossexualidade é uma característica, e não um mal que deva ser purgado? Pelo contrário.

Francamente, posso estar sendo paranoico, mas se formos ler nas entrelinhas, o que vejo no discurso do papa é a seguinte frase:

“Se uma pessoa é gay, procura Deus e tem boa vontade (isto porque reconheceu seu erro e quer mudar), quem sou eu, por caridade (pois sou um ser superior que deve levar esta alma para a luz), para julgá-la?”

Corrijam-me se eu estiver errado, mas não é essa a impressão que dá?

O fato do Papa Francisco se mostrar aberto a novas discussões, e a reverter problemas encontrados na administração anterior não muda o fato de que ele fala de um lugar muito específico: uma instituição que possui valores sólidos e que não pretende mudar de forma tão rápida. Não adianta nos iludirmos com relação a isso.

É claro que sendo este anuncio realizado logo após o sucesso da JMJ, onde o Papa saiu como uma grande figura por conta de seu carisma, as pessoas tendem a interpretar de forma aprazível tal posicionamento, mas vamos ser realistas, pouca coisa mudou no pensamento do alto clero cristão. A homossexualidade é um pecado, e deve ser convertida ou o inferno espera os pecadores, e pronto.

Agora dizer que isso é um marco... Francamente, discordo. Pra mim tem o mesmo tom da cura gay, tão criticado por uma série de pessoas, a única diferença é que foi dita de uma forma amena enquanto outros preferem tentar ganhar no grito, logo, chocando mais a população em geral.

Realmente nossa população está precisando ler mais, pois assim aprendemos a identificar os discursos que estão por detrás dos discursos, ou, em uma linguagem mais popular, ler o que está nas entrelinhas da coisa.

Enfim, é isso.

Obrigado.

sábado, 20 de julho de 2013

Coisas que valem a pena divulgar: lançamento de "O ladrão de destinos", de Nanuka Andrade

Saudações, amigos.

No dia 16 de Julho, no Shopping Iguatemi de Campinas-SP, ocorreu o lançamento de "O Ladrão de Destinos", um dos trabalhos de Nanuka Andrade, pela editor Subtítulo, que se lança na carreira da escrita fantástica.
O livro promote muita fantasia e emoção e estou doido para que o meu chegue em casa logo (risos), pois infelizmente não fui capaz de estar lá prestigiando pessoalmente.
Contudo, graças ao poder da internet, pude acompanhar alguns momentos por fotos, mesmo que postumamente.
E aqui estão elas:










Desde já, desejo muita sorte ao Nanuka e também ao pessoal da Subtítulo, que vem fazendo um excelente trabalho.
Em breve, resenha do livro...

sábado, 13 de julho de 2013

EGO, SUPEREGO, ID


Usando e abusando de meus conhecimentos rudimentares de psicanálise, gosto de pensar e repensar como estes simples elementos são tão observáveis na escrita literária. Em especial o último. Ego, a maneira como nos conhecemos e nos apresentamos ao mundo, resultado de nossos desejos mais íntimos dialogados com as pressões do mundo exterior; Superego, aquilo que está além de nós, a sociedade que nos constrange e tenta nos moldar a seus desejos; Id, a parte mais primitiva de nosso ser, nosso subconsciente, aquilo que nem mesmo nós sabemos como lidar ou sequer entender sua força e sua fome.

Aplicando isto a criação literária, podemos dizer que um livro nada mais é do que esta simples representação da mente elaborada por Freud. Afinal todos nós temos desejos de criações, das mais diversas ordens, de coisas que as vezes sequer damos conta de que desejamos, ou que são tão destoantes do resto do mundo que preferimos ignorar para não sermos lesados. Ao mesmo tempo, possuímos elementos externos a nós que de certa forma ditam os rumos de seu trabalho: o público, as editoras, a censura, todos eles com desejos próprios que tendem a moldar seu futuro trabalho, que necessita, para sobreviver, de agradar a todos esses grupos.

O resultado deste embate, entre desejos do autor e pressões do mercado, geram o livro, o ego. Aquilo que consegue ser produzido pelo duro caminho do meio do esforço literário. Por mais que muitos ainda acreditem no lema da arte pela arte, como se o artista pudesse estar completamente alheio ao mundo a sua volta, a verdade é que todos nós somos pessoas que vivem no mundo, e não podemos realizar algo que não esteja na ordem do mudando. E aqueles que tentam realizar um trabalho totalmente a parte, além de estarem se iludindo, também acabam por criar franksteins, tão alheios ao mundo que a qualidade se perde em meio a esquizofrenia de seus autores.

Não digo com isso que não exista criação, que não haja nada de inédito na escrita ficcional. Pelo contrário, há muito de inédito e de fantástico no ato de criar literatura, todavia não podemos atribuir esse fruto ao resultado do esforço exclusivo do gênio artístico, ignorando tudo o que acontece em seu entorno que, de alguma forma influencia no seu trabalho, constrangendo-o e impactando até assumir a forma que ele tem agora.

Somos o resultado daquilo que podemos ser contra o que queremos ser, daquilo que sonhamos para nós contra aquilo que os outros esperam de nós, dos nossos potenciais contra nossas limitações. Essa é a nossa condição, nosso eterno combate. E o artista não foge disto. Ele, assim como todos, luta neste cenário e “eus” e “outros” procurando estabelecer seu espaço. E muitas vezes a forma de conseguir este espaço e criando para si o personagem de artista. E marcar seu território através de seu trabalho.

sábado, 22 de junho de 2013

Saudades do Ócio


blog tão desatualizado, começo a sentir vergonha dele. Não que eu não goste mais de escrever, mas está cada dia mais difícil encontrar tempo e inspiração para tanto. A vida profissional é cansativa, e encontrar brechas para se dedicar ao trabalho intelectual é uma tarefa tão difícil que a fadiga corporal e mental impossibilitam.
Confesso que faz muito tempo que não posto aqui, e agora que olho este

Agora entendo o que Platão dizia acerca da necessidade do ócio, pois realmente é complicado manter uma carreira e um hobbie ao mesmo tempo. Ter aquele momento para pensar quando outras preocupações tomam conta da cabeça. O jeito mais simples seria tentar a feliz coincidência de mesclar os dois e seguir uma profissão que seja capaz de deleitar ao mesmo tempo em que lhe garante ascensão profissional.

O problema é que quando seu hobbie é pensar, o Brasil do séc. XXI não se mostra como o melhor espaço para lhe garantir boas oportunidades. Então o jeito é tentar se virar com duas atividades: uma para conseguir dinheiro, outra para elevar o espírito. Pois a falácia do “trabalho enobrece o homem” não cola. Por que o trabalho sozinho não enobrece ninguém.

Enfim, apesar do tom deprimente deste pequeno manifesto, não tenho por intuito desmotivar ou me lamentar para ninguém. Na verdade, acredito que escrevo este texto como forma de fazer um alerta acerca de uma cruel realidade. Cruel, mas que precisa ser vencida, e que existem estratégias para tanto.

Em um mundo corrido como o nosso, onde o tempo vale cada vez menos, a disciplina é a melhor solução. Eu realmente caí na ingenuidade de acreditar que poderia continuar como o meu ritmo dos tempos em que fazia apenas faculdade e estágio, em que os horários vagos em casa eram dedicados exclusivamente à leitura e à escrita.

Pois naquele tempo, todos os meus minutos vagos eram direcionados ao computador e às leituras, onde eu produzia bastante. Mas agora, qualquer segundo folgado só consegue ser usado para o descanso. Se eu estiver em casa, com certeza vou querer descansar, fazer uma leitura mais leve, que me garanta prazer mas que não necessariamente vá trazer grandes avanços na minha forma de pensar. Ou então assistir a um filme ou uma série, que podem trazer grandes lições ou assuntos, mas que não são suficientes para quem gosta do labor crítico.


Nesse sentido, criar o tempo é fundamental. Tornar o hobbie, quase que uma obrigação, enganar o corpo e a mente, pelo menos parcialmente, para fazê-los acreditarem que você não está fazendo aquilo que gosta apenas por que quer fazer, mas porque tem que fazer. Pois quando elas passam a ser obrigações, por mais cansados que estejamos, ainda assim conseguimos tirar forças, não sabemos donde, para realizar... Isso talvez seja nossa maior capacidade.

Dessa forma, começo a tentar me organizar. Reservar horários que até então estavam completamente disponíveis e ocupando-os com minhas obrigações/lazer. Ir para locais onde eu só poderei fazer isso, ao invés de retornar para casa onde o confortável sofá, o divertido cachorro, ou a irresistível cama vão me distanciar de meus objetivos para comigo mesmo.

Talvez essa seja a única maneira, seja de forma pessimista ou otimista, pois não sei como estas palavras podem estar sendo lidas. Mas acho que vale a penas tentar. Pois o ócio poderia ser a solução para a pacata Atenas dos primórdios do ocidente, mas se queremos manter viva a arte de pensar no terceiro milênio, temos de nos esforça um pouco mais.

Se isso vai dar certo... Bem, vamos acompanhar e ver no que vai dar.

domingo, 28 de abril de 2013

Resenha de “The Walking Dead, a ascenção do governador” ou As diferentes artes de escrever.



Quando nos referimos a um escritor, ou a arte da escrita, quantos de nós já pararam para pensar nas implicações de se referir a esse ofício de forma tão singular? Bem, eu particularmente só pensei nisso agora. Refiro-me ao fato de entender como se a arte de escrever fosse única e quem possui esse talento, é capaz de escrever sobre qualquer coisa. Então, seguindo esta lógica, um bom poeta é necessariamente um bom romancista, um bom retórico, um bom cronista, enfim, é capaz de escrever basicamente sobre tudo.
Na verdade, acho que nós fãs também temos a tendência a ver nossos ídolos com esses olhos, e cobramos deles excelência em tudo o que fazem. Fiz isso quando cobrei de Robert Kirkman a excelência no livro “The Walking Dead, a ascensão do governador”. Como fã da série de televisão e reconhecendo o talento das HQs de Kirkman, em minha cabeça o livro não podia ser nada menos do que fenomenal. E somando isso ao fato de que ele tinha em sua companhia outro autor, que apesar de não ter lido nada sobre anteriormente, era minimamente reconhecido do público americano, imaginei que a coisa só podia ser boa. Enfim... Enganei-me.
O trabalho de Kirkman e de Jay Bonansinga não só não me atraiu como foi um verdadeiro martírio. Lento, enfadonho e sem grandes surpresas para aqueles que já acompanham a série. Passar por ele não foi uma das experiências mais agradáveis. Contudo, acredito que criticar o talento do primeiro como romancista ainda é injusto. Injusto por que, afinal de contas, ele não é um romancista. Kirkman é um cartunista, trabalha como roteirista de televisão tendo outros mais experientes como apoio. Enfim, acreditar que ele seja realmente bom em tudo o que escreve é no mínimo inocência.
Eu mesmo quando me lancei na escrita acreditei que poderia escrever sobre tudo. Afinal, para alguém que consegue escrever um livro de 500 páginas, outro tipo de texto é moleza. Bem, não foi. Na verdade descobri que tenho certa dificuldade em escrever textos de tiro curto. Que sou uma pessoa prolixa por natureza. Mas ainda assim tentei. Consegui até escrever alguns contos, que saíram sofridos, mas até que bem. Tentei também poesia e esse ramo foi um completo desastre, melhor nem comentar mais...
Enfim, escrever não é uma arte única. Cada escrita tem sua forma, sua particularidade. E cada uma delas exigem um talento próprio. Sou doutrinado pela faculdade a escrever bem artigos acadêmicos. Minha formação literária e meus jogos de rpg me deram a base para escrever romances de aventura. Contudo, pouco ou nada li de poesia, de crônicas ou outros estilos que se tentar realizar hoje sairão como completos desastres.
Kirkman, tentado pela aventura ou pelo dinheiro aceitou o desafio de escrever um romance de 400 páginas e merece o crédito por dispor a cara a tapa. Contudo, se quiser continuar neste ramo, sugiro que continue a escrever boas histórias em quadrinhos a a contribuir com os roteiros de televisão, pois são uma praia melhor.

quinta-feira, 28 de março de 2013

Aperitivo - Despertar (Título Provisório)

Com a iminência da publicação de "O Véu" e a ansiedade provocada por isso, aproveito este espaço para dar uma amostra de meu novo trabalho - "Despertar" (Título provisório) - cuja história contará os primeiros dias de Ian no momento em que acorda para suas demais vidas.
Espero que apreciem
Willian Nascimento

A neve corria macia por entre minhas mãos. Aquela já devia ser a terceira vez na semana, e quem sabe a décima no mês. O mesmo chão branco, os mesmos cristais de gelo, os mesmos pinheiros. Como devia ser não ter peso? Provavelmente uma sensação muito semelhante àquela. Meu corpo sequer fazia pressão contra meus membros e eu já estava me impulsionando para frente novamente, em uma velocidade avassaladora. Correndo... ou melhor, trotando por aquela mata virgem.
Meus quatro membros tocavam o chão. A neve era atirada para trás a cada pulsão que eu empregava. Meu trote era perfeito, como o de um cão de caça. E por falar em cães, meu perseguidor estava se aproximando. Atrás de mim, um belo espécime de lobo mantinha à duras penas uma proximidade minimamente digna. Sua língua pendia para o lado, conforme suas baforadas cuspiam saliva que instantaneamente se congelavam antes de tocar o solo. Ele estava cansado, mas já estávamos chegando a nosso destino.
Foi então que, chegando a hora, cravei mãos e pés no tapete branco e freei bruscamente. Meu companheiro, desajeitadamente, fez o mesmo, atropelando-me e nos fazendo rolar ainda alguns metros antes de finalmente pararmos por completo. Eu gargalhava alto, enquanto era vítima de sua língua úmida que lambuzava meu rosto. Brincamos ainda alguns minutos, próximos a um grande barranco. Inconsequentes como éramos, nem nos preocupamos com o fato de que, com um pouco menos de atraso em nossa freada, acabaríamos os dois no fundo do desfiladeiro.
Mas não queríamos, nem conseguiríamos nos preocupar com isso. Afinal, não fora para isso que viemos de tão longe para aquele lugar. E a razão de nossa corrida já estava nos esperando. De um instante para outro, paramos com nossa brincadeira infantil e nos pomos sentados para apreciar o belo espetáculo que se abria diante de nós. O céu, antes cinzento e mórbido, agora que abria para uma aquarela ondulante. Riscos de todas as cores, dançando em um ritmo próprio, inebriante. Um fenômeno que eu costumava reconhecer como a passagem das almas, que transcendiam do mundo terreno para a dimensão espiritual, e que séculos depois descobriria que o ocidente o chamava de Aurora Boreal.
O lobo estava ao meu lado, sentado e ainda se recuperando do desgaste que nossa injusta perseguição lhe impôs. Eu acariciava seu pelo e recebia de bom grado o calor que emanava de seu dorso corpulento. Ganhei uma lambida carinhosa no rosto e retribui com um afago entre as orelhas. Olhei para o céu. Era lindo demais e eu não queria nenhuma outra companhia. Nem dos membros de meu clã, nem mesmo dela... Pois aquele era o nosso lugar secreto. Meu e de Raj.
Sentirei saudades, amigo — falei para meu companheiro, enquanto sentia uma leve dor de cabeça incomodar.
Somente um ganido me foi dado como resposta, mas que foi o suficiente para deixar claro o que ele sentia. Fiquei triste, mas ao mesmo tempo grato pelo sentimento que acabava despertando nele.
Sinto muito... — tentei me desculpar, encostando minha testa em seu pescoço e aproveitando para esconder meu rosto que ameaçava despejar algumas lágrimas. Eu não gostava de chorar na frente de ninguém de minha aldeia — Mas está na hora de eu ir... Sei que é precipitado... Que pode dar tudo errado, mas... Você me conhece. Sabe que não resisto a uma aventura. Ainda mais com ela...
A dor começava a incomodar mais. Mais intensa, e concentrada. Logo atrás dos olhos, uma pontada como se alguém estivesse introduzindo um dedo por dentro de meu cérebro.
Só queria me despedir de você antes de partir — falei, buscando ignorar a dor — Eu e... — Não consegui me lembrar do nome.
Como não conseguia? Estávamos falando dela agora mesmo.
Eu e... — a dor estava ficando insuportável — Eu e... Ela... Vamos fazer hoje... E se a magia funcionar... Vai ser ótimo.
E como sempre acontecia nesta parte, a enxaqueca assumia um grau tão agudo que me fazia perder a sensação do mundo a minha volta. Estava na hora. Eu iria acordar...
Aos poucos minha visão se tornava embaçada, até tudo ficar escuro. Porém, ao contrário de logo perder completamente o contato com a floresta de pinheirais, naquela noite em específico meus demais sentidos insistiam em guardar algumas sensações daquele sonho. O cheiro úmido das plantas, o frio e a sensação dos flocos de neve caindo sobre a pele. Contudo, estes últimos se tornavam mais agressivos e seus impactos me obrigavam a acordar com mais velocidade.
Quando abri os olhos, dei de cara com a luz do poste. Os pingos de chuva atacavam meu corpo, completamente ensopado e desprotegido devido a fina roupa que eu usava. De um salto, levantei-me, para dar conta de onde estava. Em uma olhada rápida em torno, reconheci automaticamente minha posição, embora custasse acreditar que pudesse estar na Praça da Rua Volta, cerca de cinco quadras de minha casa, onde, eu jurava, havia adormecido antes de acordar naquele lugar.
Assustado, olhei mais atentamente a minha volta a procura de alguém, ou ao menos de alguma resposta para tudo aquilo. Não encontrei nem um, nem outro. Levantei e estava descalço. A dor de cabeça havia desaparecido, mas ela sequer tangenciava minhas preocupações. Minha respiração ficou mais descompassada e o medo poderia me dominar, se a racionalidade não cobrasse uma atitude e me obrigasse a pensar. Não importava o quão maluca fosse a resposta para eu estar ali naquele momento, não seria debaixo de chuva que eu iria encontrá-la.
E com esta convicção, disparei para casa. Venci facilmente a distância que me separava de minha rua, com um vigor e condicionamento que não acreditava possuir. Ao chegar em casa, deparei-me com o portão trancado.
Droga! Praguejei, deixando o desespero também participar de meu infortúnio. Procurei no bolso de meu short pela chave, mas nada. Não é possível, como então eu saí? Naquele instante, a resposta parecia ter vindo na forma da janela aberta de meu quarto. Olhei para cima e a contemplei. Eu também me lembrava de tê-la fechado antes de dormir, para que a tempestade não alagasse meus aposentos.
Não. Impossível. Não havia forma de eu saltar pela janela dormindo sem quebrar ao menos uma perna. Devia haver outro modo. Mas como já havia percebido antes, não encontraria nenhuma resposta ali fora. Então tratei de trepar o muro de casa para me proteger da chuva. Invadir o quintal foi mais fácil do que supunha, mas agora havia outro problema: como entrar na residência? A alternativa de dormir no sereno não era agradável.
Rondei a casa, atrás de alguma passagem aberta. A sorte me sorriu, ao menos. Vi que a janela que dava acesso a lavabo estava entreaberta. Sem pensar, meti a mão e forcei a entrada. A janela era velha e um pouco enferrujada, por isso que muitas vezes não conseguíamos fechá-la por completo. Mas como naquela noite em especial eu demonstrava uma saúde muito satisfatória para meus padrões, assim também o foi quando tentei abrir a janela. E ela se abriu sem muita resistência.
Na lavanderia, tratei de pegar uma toalha no secador de roupas e me enxugar. Não queria ensopar a casa. Tirando a roupa molhada e colocando-a dentro do tanque, enrolei a toalha na cintura e foi com cautela até meu quarto. A casa estava silenciosa, o que era uma boa notícia, possivelmente. Passei pelo quarto de meus pais antes de chegar ao meu e fiquei feliz em ver que ambos dormiam a sono pesado. Pelo menos minha aventura noturna não fora percebida por nenhum dos dois.
Esgueirei-me pelo pelo corredor até me refugiar em meu aposento. Fechei a porta e fui até a janela. A mesinha que ficava diante desta estava ensopada, mas não me importei. Olhei para uma última vez pela abertura antes de fechá-la. Queria entender como afinal eu havia fugido de casa, mas eu não estava com cabeça para pensar. Tentei lembrar do sonho e consegui visualizar tudo com muita nitidez, até seu final, quando a enxaqueca voltou a me incomodar.
Interpretei aquilo como um sinal para não fuçar mais aquela história. Não por aquela noite, ao menos. Conformado, vesti um short seco e me deitei. Achei que não fosse conseguir dormir, todavia subestimei meu sono pesado. E logo eu estava, mais uma vez, entregue ao mundo dos sonhos. Só esperava, daquela vez, acordar em minha cama.

sábado, 2 de março de 2013

Coisas que valem a pena digulgar: Pequenos poemas, grandes emoções; de Leonardo Pacheco



Saudações colegas do Por Detrás do Véu.
 
Recentemente, foi publicado no Brasil uma boa notícia para os fãs de poesia.
Trata-se do trabalho "Pequenos poemas, grandes emoções" do novo poeta Leonardo Pacheco, com gravação de Evaristo Kooh.


Trata-se de uma boa pedida para presentear a pessoa amada ou ter momentos de reflexão mesmo dentro de nosso caos urbano, podendo ouvir no carro ou na condução a caminho das atividades. Ou em casa, no conforto do lar.
 
 
Para mais informações:
 

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

Resenha: O livro do fim do mundo, diversos autores


Pegando carona na onda apocalíptica gerada pela profecia Maia, a editora Subtítulo lançou mão desta publicação que reúne mais de trinta contos de autores dos quatro cantos do Brasil. Organizado por Alessandro Finardi, Eder Rosa e Márcio Saconato, “O livro do fim do mundo” se propõe a explorar as sensações humanas levadas ao limite ao ter como norte das propostas dos contistas a seguinte indagação: “o que você faria se o mundo fosse acabar em uma hora?”.

A qualidade dos trabalhos é variada, atraindo e repudiando diferentes gostos e estilos de leitores. No geral, as histórias exploram o medo, a violência e as redenções esperadas com a iminência do fim. E como não tenho condições de falar de cada um dos trabalhos que estão aqui presentes, escolho os meus três favoritos para dedicar linhas especiais.

O primeiro, “...and I feel fine” de Leandro Samora, mereceu um artigo próprio, publicado anteriormente aqui no Por detrás do Véu. Tal empatia que me gerou o trabalho se baseia no fato de este, com um tom irônico e divertido, tocar fundo em questões interessantes a respeito da vida e do tão sonhado “fazer valer a pena”. Um conto que de forma ácida, nos faz repensar máximas já batidas, presentes nos mais pueris livros de autoajuda.

“Carta à senhorita Wargrave” foi uma iniciativa ousada de Cássio Maia. Ousada, pois distorceu aquilo que se comumente esperava da proposta inicial da antologia. Nele, não temos um apocalipse geral, mas um fim do mundo muito particular. Algo que tinha tudo para dar errado, mas que graças à originalidade e ao talento estético do autor acabou por se converter em uma obra prima e que merece o devido destaque.

E por último, mas não menos importante, “Das consequências para quem noticia o fim do mundo”, de Raul Gimenez. Este conto se destaca por trazer uma crítica sutil e inteligente dos valores que permeiam nossa sociedade. Do desapego e ceticismo que podem acometer nossos corações modernos mesmo na iminência do fim.

O gênero conto é o ideal para pessoas que, como a maioria de nosso presente volátil, percebem que o relógio corre cada vez mais rápido; que cada vez dispomos de menos tempo para fazer as coisas simples da vida. Nesse sentido, “O livro do fim do mundo”, além de se encaixar perfeitamente nessa realidade, fornecendo leituras agradáveis para pessoas que só possuem tempo para ler nos intervalos da vida, também oferece um esforço crítico acerca das condições que criaram essa sociedade que taxa preços cada vez mais altos para seu tempo e ainda assim continua sem saber lhe dar o devido valor.
 

 

 

 

 

Resenha: Jarbas, de André Bozzetto Jr.


Em uma era onde as figuras de nossos pesadelos do passado se transformam em personagens andróginas de romances adolescentes, encontrar um livro como “Jarbas” nos enche de espanto e agradável nostalgia. Recheado de muita tensão, violência e crueldade, o trabalho de André Bozzetto Jr. garante ao leitor bons momentos de frisson e adrenalina, permeados de aventuras noturnas em um mundo perigoso e decadente, no melhor estilo punk & gótico.

Jarbas é um jovem de classe média, cuja natureza bestial precede em muito sua transformação em lobisomem. Entregue a sua natureza animalesca como talvez nenhum outro licantropo se tenha permitido, este jovem vaga pelas noites deixando para trás trilhas de sangue, violação e profundo terror. Seu nome, conhecido e temido por humanos e outros seres sobrenaturais, passa a ser palavra chave nas principais caçadas noturnas.

Os personagens de “Jarbas” são, em geral, frios. Pessoas sofridas que se tornam endurecidas pelas experiências traumáticas de suas vidas. Existem aqueles ainda que tentam conservar a inocência, todavia estes são os primeiros a serem engolidos pela natureza selvagem própria deste romance de Bozzetto.

Do ponto de vista estilístico, este é um trabalho bastante interessante, onde a história do jovem lobisomem é conta através de inúmeros recursos. Em alguns momentos, temos a narrativa imparcial em terceira pessoa, em outros o relato vivo de suas vítimas. É provável que alguns leitores percebam pouca diferença entre os tons dos relatos, deixando a escrita muito uniforme. Contudo, escrever diferentes relatos, onde cada um deles expressa a experiência de uma personagens específica, carregada de suas singularidades psicológicas e seus vícios de linguagens não é um tarefa fácil. E André, sem dúvidas, não faz feio em sua empreitada.

Em suma, o que tenho a dizer de “Jarbas” é que este é um livro altamente recomendado. Ele não está comprometido em fornecer grandes momentos de reflexão, mas se propõe a garantir fortes emoções e aventuras dignas dos estômagos mais fortes. E para leitores com saudade dos antigos monstros, este é um prato cheio.
 

domingo, 20 de janeiro de 2013

"Minha vida foi F..."


 
Parece que a o futuro havia se acabado para aquela cidade. Isolados do contato com o mundo externo há dias, seus habitantes vão gradativamente degenerando em todos os pontos que constituem suas já frágeis humanidades. Comida, remédio, saneamento não existem mais, e a barbárie começa a ganhar forma conforme o desespero toma conta de seus corações. E se isso tudo não bastasse, estes houvem dos céus a mensagem redentora, de que uma explosão colocará fim a suas vidas medíocres em questão de alguns minutos. Então, restava somente esperar.
Todavia, dentre os infortunados moradores da pacata região, está um homem de meia idade, gordo, solitário. Dono de seu próprio negócio, uma loja de revistas em quadrinhos, onde passou boa parte do tempo maltratando seus clientes, escolheu este lugar, onde passou anos de sua vida, para refletir sobre sua existência. Seu comportamento rude e seus poucos cuidados estéticos afastaram as pessoas de sua vida. Ele não tinha namorada, poucos amigos, e seus clientes não passavam de eventuais relações comerciais.
Sua vida inteira havia sido dedicada aos quadrinhos, coisa da qual mais gostava, que lhe rendeu ótimas discussões, momentos de puro entretenimento, reflexões arrojadas, mas pouco contato humano. E agora, faltando apenas alguns minutos para o fim, nosso herói cai de joelhos ao solo, rendido pelo final iminente e grita: “Minha vida valeu a pena!”
Àqueles que não reconheceram a cena acima, trata-se de uma curta passagem do filme “Os Simpsons”, lançado em agosto de 2007 . Nela, o cara da loja de quadrinhos faz uma reflexão acerca de sua vida e a resposta para sua avaliação, não muito esperada em tamanho contexto, fez muitos admiradores rirem e, em alguns casos, pensarem. Em minha opinião, foi uma das melhores sacadas de todo o filme, que teve inúmeros outros momentos memoráveis.
Fazer a vida valer a pena é uma tópica comum. Algo presente em quase todos os momentos de nossas vidas e que acredito ser impossível nenhum de nós não termos nos deparado com ela algum momento. Contudo, fazer valer a pena acaba, para muitos, caindo em um terreno acidentado. Pois o que seria fazer valer a pena? Se perguntarmos para as pessoas a nossa volta, frases comuns como “ser feliz”, “aproveitar os momentos”, “ser sincero”, “ter alguém importante ao seu lado”, e outras presentes até mesmo nos mais rasos livros de autoajuda. Alguns até arriscam uma receita de bolo mais elaborada, mas pouco eficiente.
Normalmente nossa sociedade já possui um modelo pronto. Uma lista de coisas que precisamos fazer para conquistarmos a tão sonhada felicidade e conseguir chegar ao final da vida a sermos capazes de gritar “minha vida valeu a pena”. Uma lista pequena: ser inteligente, bonito, sociável, carismático, engraçado, ter muitos amigos, praticar esportes, ter um bom emprego, constituir família, ganhar muito dinheiro, ajudar o próximo, conseguir o carro do ano, ser pegador (no caso dos homens), ser recatada (no caso das mulheres), ser saudável, gostar de noitadas, televisão e futebol, manter-se vivo...
Entretanto, apesar de já termos esse nosso modelo didático e a prova de falhas, existem aquelas pessoas que insistem, seja por vontade ou por azar do destino, em querer encontrara a felicidade fugindo dele. Pessoas como o cara da loja de gibis. Que não gosta de sair a noite, de azarar, que prefere os momentos sozinho à jogar conversa fora com pessoas que não valham a pena; que escolhe o mundo da ficção, onde as coisas sempre se resolvem no final, ao invés de nosso mundo perfeito, cheio de injustiças, corrupção e dor. Que optou por uma profissão “menor” onde estaria em contato com tudo aquilo de que gosta, ao invés de um emprego em que poderia ganhar grandes quantidades de dinheiro em troca apenas de um pouco de estresse, decepção e sacrifícios. 

Enfim, da para entender um cara desses?
Sendo eu escritor de literatura fantástica, vocês já devem ter percebido que há um pouco de pessoalidade neste texto. Pois há mesmo. Na época, foi um filme que muito me cativou e tal pensamento me foi reavivado com a leitura de “O livro do fim do mundo”, uma coletânea de contos que nasceu com a proposta de pensar “o que você faria se o mundo fosse acabar em uma hora?” E o conto “...and I feel fine”, de Leandro Samora tocou muito bem neste ponto da questão. Pois a verdade é, se viver fazendo aquilo que nos da vontade sem causar mal a ninguém não é fazer valer a pena... Bem, eu não sei mais o que é.


terça-feira, 1 de janeiro de 2013

Resenha: O evangelho segundo os Simpsons, de Mark I. Pinsky


 
Trabalhar com a família mais divertida da América já é um bom pretexto para um livro ser um sucesso. Some isso a uma discussão que englobe religião e costumes americanos e você tem grandes chances de conseguir um Best Seller. “O evangelho segundo os Simpsons” é uma coleção de artigos de Mark I. Pinsky em que o jornalista se propõe a observar como a temática religiosa aparece no desenho animado.

Com um argumento forte, a de que as critica de “Os Simpsons” deve ser pensada mais como uma crítica aos costumes religiosos norte americanos e não propriamente a experiência religiosa em si, e também com uma boa percepção de como “Os Simpsons”, apesar de seu perfil “imoral”, traz em si grande dose de moralidade cristã em seus roteiros, o livro começa bem. Todavia, apresenta certas falhas no modo em que estrutura seus argumentos.

Em primeiro lugar, a organização temática é um tanto quando falha. O livro é dividido em grandes temas como “imagens divinas”, “a igreja e o pregador”, “católicos”, “judeus”, “hindus” onde são discutidos todos os aspectos dessas ideias que por si só já são imensas. E tal estratégia tende ao caos, levando-se em consideração que Pinsky fala de cerca de quinze temporadas.

Outro problema, e este entrelaçado a questão de desorganização, é que o autor não cita os episódios. Em vários momentos ele apenas reproduz a fala dos personagens sem dizer qual episódio, qual temporada ou em que situação tal personagem diz alguma coisa, nem mesmo em uma nota de rodapé. E mesmo eu, que me considero um fanático no desenho, tive sérias dificuldades em identificar alguns dos argumentos do autor. E essa falta de citação acaba por gerar dois problemas.

O primeiro já foi dito, pois dificulta a leitura deste “evangelho”, na medida em que o apreciador não consegue, muitas vezes, situar-se em meio aos argumentos do autor. Outro é que acaba por esconder certas ações tendenciosas do próprio Pinsky. Em alguns momentos fui capaz de perceber certas distorções na retórica deste.

Algumas interpretações horas são forçadas, horas distorcidas. Tudo para validar a tese principal do livro. Os personagens são vistos exageradamente como coesos, ignorando assim as próprias transformações que Homer, Marge, Lisa e Bart sofrem ao longo das temporadas. Modificações essas que são comuns ao longo das temporadas, por se tratar de um desenho que também é comercial e onde os personagens são produzidos para agradar ao público, e por isso vão se adaptando a suas melhores características, ressaltando-as.

Outro problema, e deste eu retiro Pinsky, é com relação à tradução e revisão. Muitas passagens foram traduzidas erroneamente, confundindo falas e personagens, e a revisão deixou passar erros básicos que um segundo olhar de um revisor poderia ter facilmente percebido. E algumas passagens parecem até que foram jogadas no tradutor Google e inseridas ao livro desta mesma forma.

Enfim, apesar de não parecer, eu posso dizer que gostei da leitura. Gostei porque me permitiu discutir temas de que gosto muito. Por ser um fã de “Os Simpsons” e um estudioso de história das religiões, adorei a temática do livro. E justamente por discordar imensamente de Pinksy em diversos momentos, “o evangelho segundo os Simpsons” me permitiu momentos de puro exercício intelectual. Contudo, temo que pessoas não muito inseridas nessas duas temáticas possam, ou não se sentirem amplamente convidados a participar do livro, ou então acabarem por comprar argumentos muito pouco sustentáveis.

 

 

 

 

Resenha: Marina, de Carlos Ruiz Zafón


 
Antes de se consagrar como o mega autor de “A sombra do vento” e “O jogo do anjo”, Carlos Ruiz Zafón se aventurou pelo universo da literatura juvenil. Seus trabalhos anteriores aos dois Best Sellers, por conta que questões burocráticas, acabaram ficando presos para novas publicações, o que prejudicou o acesso ao grande público. “Marina” é um desses livros que há pouco tempo ganhou sua liberdade e chega as livrarias brasileiras.

“Marina” é um dos livros difíceis de enquadrar em um gênero específico. Em momentos, temos a impressão de ser um romance básico, estilo água com açúcar, ao longo das páginas somos convidados a uma leitura dramática e profunda. Depois, nos surpreendemos com a entrada densa do suspense, até o momento em que nos vemos rodeados por uma aventura fantástica contemporânea pelas ruas de Barcelona.

Para aqueles acostumados ao estilo de Zafón, nada de novo. Pois a mistura de estilos e gêneros é uma das principais marcas e, vale ressaltar, um dos principais encantos da escrita deste espanhol naturalizado americano. Quando lemos “Marina”, temos as nuances da marca única de Carlos Luiz Zafón. Marcas essas que o transformarão no escritor da obra prima “A sombra do vento”.

Oscar é um garoto precoce das ruas de Barcelona. Vivendo em um internato sufocante m separado de sua família, ele se torna um jovem errante, onde as alegrias do dia se resumem em vasculhar a velha e sombria cidade espanhola. Todavia, tudo muda quando, em uma de suas incursões, acaba adentrando na casa de Marina, menina encantadora e destemida.

Logo, Marina se torna a principal companhia de aventuras de Oscar e ambos se metem pelas ruelas esquecidas da cidade, repleta de segredos sombrios em seus becos e lugares esquecidos. Um lugar onde os habitantes, vivendo a rotina de seus dias, existem sem imaginar as fantásticas e horripilantes estórias que se escondem por aqueles muros. E é em um desses grandes segredos, de uma vida de lutas, perdas e vinganças, que as vidas de Oscar e Marina acabam entrando e mudando completamente o rumo da história.

Uma leitura marcada por grandes reviravoltas é o que espera o aventureiro de “Marina”. Na verdade, para leitores acostumados, este livro parece se apresentar como um ensaio de suas futuras obras. Onde um estilo único é tecido. Que venham os outros livros trancafiados de Zafón.